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Regresso ao retrocesso: Brasil ressuscita PEC da maioridade penal

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Por: Sam Aman, Analista no Conselho de Assuntos Hemisféricos

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O Congresso Nacional do Brasil está revisando atualmente uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduziria a idade da maioridade penal dos 18 para os 16 anos. Introduzida pela primeira vez há 22 anos, a PEC só agora vem ganhando força na legislatura, passando pela primeira etapa de aprovação em março. Louvada por alguns como a solução às crescentes taxas de crime no país, a emenda tem gerado, todavia, bastante discórdia entre as já polarizadas elites políticas do Brasil. Enquanto continuam as deliberações, opositores e observadores internacionais temem que tal lei possa apenas exacerbar o complexo problema da criminalidade juvenil em uma das sociedades mais dinâmicas e desiguais do mundo.

Histórico e Cronologia Legislativa

O atual Código Penal do Brasil estabelece a maioridade penal aos 18 anos. Em 1990 foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que define medidas disciplinares especiais para menores condenados de crimes, e foi renomado dentro e fora do Brasil pela abordagem abrangente à proteção e reabilitação das crianças. O Estatuto destaca medidas como advertências e obrigações legais de reparar danos ou pagar indenizações, além da prestação obrigatória de serviços à comunidade. Em casos de crimes hediondos, reincidência, ou de não cumprimento de medidas disciplinares, o ECA prevê internação de até três anos em “instituições socioeducativas”, centros de detenção juvenil orientados à reabilitação assistida e à continuação da educação.[1]

Em 1993, o deputado evangélico Benedito Domingos (PP-DF) apresentou uma proposta permeada de alusões bíblicas que propôs a redução da maioridade penal para os 16 anos. A PEC 171/93 mantém as disposições estabelecidas pelo ECA, mas prevê a aplicação das mesmas apenas para adolescentes com até 15 anos de idade.[2]

Domingos justificou a proposta alegando que, em 1940, quando a maioridade penal foi fixada aos 18 anos, os adolescentes possuíam “um desenvolvimento mental inferior aos jovens de hoje da mesma idade.”[3] A PEC 171 não conseguiu ultrapassar os obstáculos legislativos e passou os próximos 22 anos efetivamente dormente na Câmara dos Deputados.

Hoje o debate está sendo reascendido, com o Congresso mais conservador dos últimos 50 anos proporcionando à legislação uma inédita oportunidade de ser aprovada.[4]

Em março, a PEC 171 superou o seu primeiro empecilho legal ao ganhar aprovação pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara, que avalia apenas a constitucionalidade de propostos projetos de lei. O deputado Luiz Couto (PT-PB) encabeçou a oposição ao projeto, afirmando que o mesmo representa uma violação de uma cláusula pétrea da Constituição por implicar um desrespeito dos direitos individuais. Porém, no dia 31 de março, por um voto de 42 a 17, a CCJC decidiu pela primeira vez desde o arranque da PEC 171 que a proposta não viola a Constituição.[5]

No dia 8 de abril, o projeto embarcou na próxima etapa do processo legislativo ao entrar numa fase de deliberações por uma Comissão Especial constituída por 27 deputados federais. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que apoia abertamente a PEC 171, nomeou o deputado André Moura (PSC-SE), outro integrante da bancada evangélica, como presidente da Comissão.[6]

A Comissão terá um prazo de até 40 sessões plenárias para decidir se aprovará a proposta para votação na Câmara ou se a arquivará, com a decisão antecipada até o final de  junho.[7] Para a consternação da Presidente Dilma Rousseff, que ultimamente tem expressado sua inabalável condenação da PEC 171, um levantamento congressional realizado em abril dos 27 membros da Comissão revelou que 21 são favoráveis à redução da maioridade penal.[8] Catorze destes apoiam a medida apenas em casos dos chamados crimes hediondos—homicídio, estupro, sequestro, etc.—e sete a apoiam para qualquer tipo de crime.[9]

Na provável eventualidade da Comissão aprovar a proposta, ela prosseguirá para o hemiciclo da Câmara para dois turnos de votação em sessão plenária, onde precisará de ao menos 308 votos—3/5 da Câmara—em cada turno para ser encaminhada para o Senado. Lá, a PEC 171 será analisada pela própria CCJC do Senado, que terá de avaliar outra vez a constitucionalidade da proposta. Uma vez considerada admissível, prosseguirá para mais dois turnos de votação em sessão plenária, onde precisará de ao menos 49 votos—3/5 do Senado—em cada turno e sem alterações à linguagem.[10] Visto que emendas constitucionais no Brasil não requerem ratificação pelo Presidente, se a PEC 171 conseguir passar pelo Congresso—um feito que agora parece mais provável do que nunca dada a atual composição da legislatura—os jovens marginalizados do país de fato serão introduzidos a um caquético sistema penitenciário antes mesmo de chegarem à idade adulta.

Por Que Agora?

O recente avanço do que era, pelos últimos 22 anos, uma legislação moribunda, é indicativo da atual situação política no país. A desaceleração econômica e os contínuos escândalos de corrupção têm gerado um ambiente cada vez mais hostil para a Presidente Rousseff, cujos índices de aprovação caíram em março para o nível recorde de 13 por cento.[11] Manifestações reivindicando o impeachment da Presidente trouxeram centenas de milhares para as ruas das principais cidades brasileiras, e o descontentamento público com o PT está numa alta recorde.[12]

O escândalo do Petrolão, implicando a Petrobras e principalmente membros da coligação governante num esquema de lavagem e desvio de dinheiro, tem provocado a ira de uma população já intimamente familiarizada com trapaça política. A vitória de Rousseff nas eleições de 2014 foi amansada pela notável perda de representação do PT no Congresso. Certamente, o segundo mandato da Presidente foi destinado a ser penoso desde o início, mas é improvável que ela pudesse estar preparada para a avalanche de oportunismo legislativo que tem se desenvolvido desde então.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e seu igualmente direitista homólogo senatorial, Renan Calheiros (PMDB-AL), têm capitalizado da indignação popular para avançar medidas conservadoras como a PEC 171 na legislatura. Embora os dois tenham sido acusados em casos de estelionato e sonegação fiscal, eles têm conseguido desviar a atenção disto por se posicionarem cada vez mais fortemente contra Rousseff e o PT.[13]

Em março, Cunha ressuscitou a PEC 457, uma proposta introduzida pela primeira vez em 2005 que aumenta de 70 para 75 anos a idade da aposentadoria compulsória para ministros de tribunais superiores. O timing está longe de ser um mero acaso, visto que sob a lei original, cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) estavam previstos para aposentarem-se durante o segundo mandato da Presidente. A chamada “PEC da Bengala” coloca convenientemente nas mãos do sucessor de Rousseff a tarefa de indicar os novos ministros. A proposta foi aprovada no dia 7 de maio, e com ela, Cunha conseguiu efetivamente impedir que a Presidente deixe a sua marca no STF.[14]

No jogo político do gato e do rato que vem se desenvolvendo entre os poderes legislativo e executivo, as provações acabrunhando o governo de Rousseff parecem estar inclinando a balança rapidamente a favor do gato. O Congresso conservador vê na crise de imagem pública da Presidente uma oportunidade para impor medidas que, até agora, têm recolhido pouco apoio.

No caso da PEC 171, seus proponentes encontram-se convenientemente auxiliados por um surto recente de criminalidade, com o Brasil registrando atualmente os níveis mais altos de mortes por armas de fogo das últimas décadas.[15] Cidades, particularmente do Nordeste, estão enfrentando um palpável declínio na segurança pública, e o crescente desespero popular tem conferido um impulso político a qualquer legislação vista como adversa à violência.

Diversos homicídios de alta notoriedade envolvendo autores adolescentes têm contribuído ao inédito apoio público para a redução da maioridade penal. Frequentemente citado é o caso de Yorrally Dias Ferreira, 14, que foi baleada fatalmente pelo ex-namorado apenas dois dias antes de ele completar 18 anos. O assassino de Ferreira gravou o corpo sangrento da menina e divulgou as imagens na Internet, chocando o país e gerando revolta nas redes sociais. Em abril do ano anterior, o estudante Victor Deppman foi morto durante um assalto na capital paulista. Seu assassino completou 18 anos três dias depois.[16]

A ambos os casos amplamente divulgados seguiu-se bastante indignação pública, pois, de acordo com o ECA, os autores foram condenados a um máximo de três anos de internação em um centro socioeducativo. Tendo cometido os delitos uma semana depois, eles poderiam enfrentar até 30 anos de prisão, a sentença máxima prevista pela lei estatutária do Brasil.[17]

Figuras proeminentes da direita, notavelmente a polêmica jornalista Rachel Sheherazade, começaram a intensificar a sua retórica em relação à maioridade penal, capitalizando destes e de outros casos semelhantes para suscitar adesão popular à PEC 171. No dia 30 de março, um dia antes do projeto ser aprovado pela CCJC, Sheherazade publicou no seu blog um post intitulado “Chega de Impunidade!”, ecoando um lema sobejamente conhecido pelo público brasileiro. No post, ela citou o PT e seus “cúmplices” como os principais obstáculos à luta pela accountability.[18] Dois dias depois, a comentarista comemorou a aprovação da proposta com outra publicação. Sob o título “Dez Razões”, o post consistiu meramente em uma lista de dez brasileiros mortos por adolescentes.[19]

Este e outros similares apelos ao público parecem estar funcionando. Uma pesquisa realizada pelo Datafolha no dia 24 de abril revelou que 87 por cento dos brasileiros são favoráveis à redução da maioridade penal.[20] Com taxas recordes de criminalidade abalando a população e escândalos de corrupção gerando insatisfação popular com o onipresente ciclo de impunidade no país, legisladores conservadores encontram-se em uma posição privilegiada para levar a PEC 171 a bom porto.

Mas a proposta de décadas atrás agora serve de modo mais forte como instrumento político para a direita afirmar seu domínio legislativo sobre a conturbada administração de Rousseff. Qualquer eventual diminuição dos índices de criminalidade que a medida possa induzir certamente será, na melhor das hipóteses, marginal. Dada a estrutura da sociedade brasileira e o atual estado do sistema penitenciário, esta emenda, teoricamente proposta “para o bem do povo,” sequer chegará perto de cumprir tal finalidade caso aprovada. A PEC 171 nada mais é do que uma resposta reacionária às crescentes percepções públicas de desordem e iniquidade, uma solução por demais simplista para um problema extremamente complexo.

Implicações e Alternativas

O fervor com que os proponentes da PEC 171 defendem o projeto, saudando-o como uma ferramenta crucial na luta contra o crime, é interessante quando levada em consideração a incidência real da criminalidade juvenil. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) estima que, dos mais de 56.000 homicídios registrados no Brasil em 2012, menos de um por cento foram cometidos por adolescentes com entre 16 e 18 anos de idade.[21]

Mesmo diante de tais estatísticas, comentaristas e políticos conservadores continuam a retratar os jovens moradores de favelas no país como perpetradores, agarrando-se a qualquer palha na forma de assassinatos de alto perfil, enquanto a realidade não poderia estar mais distante. Muito pelo contrário, os jovens são as maiores vítimas de homicídio no Brasil, desproporcionalmente mais do que adultos. O UNICEF estima que para adolescentes que morrem de fatores externos, o homicídio é a causa de morte em 36,5 por cento dos casos, enquanto a mesma estatística para a população geral é de 4,8 por cento.[22]

E ainda assim, Sheherazade, Cunha, Calheiros e afins escolhem focar em endurecer as punições para infratores menores de idade ao invés de enfrentar os problemas sócio-institucionais que os colocam numa posição de depravação e vulnerabilidade. Para o jovem pobre e negro morando na desprezada periferia, uma falta de oportunidades e a força palpavelmente repressiva do racismo institucional deixam pouco espaço para sonhos e ambições.

Um anêmico sistema de educação pública e níveis gravemente baixos de investimento em infraestrutura nestas comunidades têm implicações abrangentes. A negligência dos governos federal e municipais apenas vem somar-se à exclusão social inerente em pertencer a tais comunidades. A resultante marginalização destas populações é visível até na evolução da linguagem: a própria palavra “marginal” tem chegado a ser utilizada de forma pejorativa em referência, mais frequentemente, a jovens moradores de favelas.[23] A prevalência da palavra como substantivo—utilizada várias vezes por Sheherazade durante transmissões do Jornal do SBT—é indicativa de uma tendência na sociedade brasileira de relegar estes indivíduos a um status subumano.

A PEC 171, então, pode entender-se dentro deste paradigma como meramente outro mecanismo de supressão, velado sob o pretexto de “combater a impunidade.” Na prática, o projeto pouco mais fará do que precipitar a inserção de jovens desfavorecidos no pesadelo humanitário que é o sistema penitenciário brasileiro.

Apresentando o quarto maior número de cidadãos encarcerados no mundo (atrás apenas dos Estados Unidos, China, e Rússia), o Brasil encontra-se atualmente em uma precária situação de superlotação devido à escassez de celas de prisão. Os 550.000 prisioneiros do país ocupam um sistema com capacidade apenas para 300.000, e celas lotadas de seis vezes o número adequado de presos não são imagens atípicas. Em 2012, 367 médicos atenderam ao meio milhão de presos, e as 32.000 prisioneiras no país tinham apenas 15 ginecologistas à sua disposição.[24]

Relatos de tortura nas mãos de guardas prisionais e massacres dentro das paredes dos presídios são recorrentes, e inúmeras organizações, tanto domésticas quanto internacionais, têm denunciado os rotineiros abusos de direitos humanos que caracterizam o sistema penitenciário brasileiro. O Departamento de Estado dos Estados Unidos, em seu Relatório de Direitos Humanos no Brasil de 2013, notou que infratores de pequenos delitos eventualmente são mantidos ao lado de assassinos e traficantes em celas insalubres, onde as taxas de prevalência de HIV e tuberculose são consideravelmente superiores àquelas da população geral.[25]

Igualmente preocupante é a taxa de reincidência na população prisional, com o Conselho Nacional de Justiça estimando que uns 70 por cento dos presidiários do país reincidam depois de serem libertados.[26] Em um sistema pejado de influência de gangues, com pouca prioridade dada à reabilitação, as prisões efetivamente tornam-se campos de treino para a criminalidade. Jogar adolescentes em tal ambiente, então, apenas facilitará a transformação de delinquentes juvenis em verdadeiros criminosos. Sob a atual lei brasileira, infratores menores de idade são sujeitos a medidas socioeducativas, inclusive internação em centros de detenção juvenil, uma disposição que tem se mostrado bem mais eficaz.

A Fundação CASA (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente), uma instituição vinculada ao governo estadual de São Paulo, administra a rede de 148 centros socioeducativos no estado, que conta com quase 50 por cento dos adolescentes detidos no país. Em uma entrevista com o Conselho de Assuntos Hemisféricos, Berenice Giannella, presidente da Fundação CASA explicou a metodologia da instituição e esclareceu como os centros de internação mantêm índices de reincidência tão baixos—cerca de 13 por cento, em comparação com o 70 por cento do sistema penitenciário federal.[27]

“As medidas socioeducativas têm efetivamente um caráter pedagógico,” relatou a presidente, e de fato, os contrastes entre a abordagem da Fundação CASA e a dos presídios são gritantes. “Nas nossas unidades, os adolescentes frequentam escola, fazem cursos de educação profissional, têm atividades esportivas.” Giannella ressaltou que a internação nestes centros, uma medida referida pela fundação como “privação de liberdade”, é cuidadosamente concebida para não implicar uma privação de dignidade. “Nós trabalhamos com unidades pequenas,” ela continuou, “a maioria das nossas unidades tem entre 60 e 70 adolescentes, o que é muito diferente do presídio.” Os detidos “têm atendimento de psicólogos e assistentes sociais,” e, em contraste com as baixas razões a este respeito no sistema penitenciário, a Fundação CASA “[trabalha] com um psicólogo e um assistente social para cada 20 meninos.”[28]

O êxito da instituição quanto à reabilitação dos jovens é reflexo da sua missão. “O intuito principal,” explicou a presidente, “é a reintegração do adolescente à sociedade.” Mas com a PEC 171 ganhando força na legislatura, os jovens beneficiando desta abordagem holística à remediação agora encontram-se em risco de serem deixados para definhar nas prisões superlotadas do país, privados de tanto sua liberdade como sua dignidade.

“O fato é que reduzir a maioridade penal não vai resolver o problema da insegurança,” afirmou Giannella. “[Os adolescentes] serão pessoas facilmente corrompidas dentro dos presídios,” onde ela aduz que “a chance deles serem recuperados é mínima.” De fato, a proposta pode servir para apenas exacerbar o problema da criminalidade juvenil. Nos seus esforços de contornar a nova lei, “os criminosos que usam muitas vezes os adolescentes para os crimes, o tráfico principalmente, eles vão cada vez pegar meninos mais jovens.”

Para Giannella, a solução reside, não em endurecer as punições para jovens infratores, mas em consertar o Brasil em si. “Muitos [dos nossos internados] nunca tiveram acesso à saúde adequada,” ela explicou. “Acho que nós precisaríamos melhorar muito a questão do acesso aos bens sociais—tentar criar uma sociedade mais justa antes de punir os jovens, lembrando que a população jovem é a grande vítima dos homicídios no Brasil.”

Os inúmeros problemas sociais do país são, de fato, uma formidável fera, que precisará de gerações de esforço consciente para ser amansada. Para aqueles que desejam um reparo imediato para o problema da impunidade, Giannella salienta que uma reforma completa do sistema judicial é a solução mais prudente. Apesar da astronômica população prisional, a força policial do Brasil apresenta um índice de esclarecimento muito baixo, com apenas 15 por cento dos crimes nos estados de Rio de Janeiro e Minas Gerais sendo esclarecidos.[29] Segundo Giannella, isto contribui à “sensação de impunidade que as pessoas têm, ou essa sensação de que praticar crimes vale a pena.”

“Se tivéssemos no Brasil uma investigação policial mais eficiente,” ela explicou, “o que significaria que a pessoa no primeiro ato já fosse apreendida, isso não geraria uma sensação de impunidade, e certamente desestimularia as pessoas a praticarem crimes.” Em um país onde o crime violento é uma realidade cotidiana e relatos de condenações bem-sucedidas são mais a exceção do que a regra, a indignação pública é compreensível. Mas Giannella acredita que esta indignação está sendo deslocada, visto que é decididamente mais fácil focar em endurecer punições do que em revisar o sistema judicial. Ela mantém que, com uma reforma abrangente, “haveria uma percepção da sociedade melhor em relação à questão da segurança,” enquanto qualquer melhoria provocada pela PEC 171 a este respeito certamente será de pouca duração.

Conclusão

Décadas após seu arranque, a PEC 171 agora encontra-se em uma posição sem precedente na legislatura do Brasil. Divisões partidárias profundas têm gerado fricção intensa entre as elites políticas do país, com uma luta pela legitimidade na esquerda e uma retórica oportunista cada vez mais incisiva proveniente da direita. A resultante instabilidade tem servido de catalisador legislativo para a agenda da oposição, e com a PEC 171 tramitando pelo Congresso, o braço-de-ferro político em Brasília agora carrega implicações para os mais invisíveis dos invisíveis.

Em um país onde divisões raciais são palpáveis, onde serviços públicos são públicos apenas no nome, onde três séculos de escravidão jamais foram seguidos de algum movimento de direito civil, e onde a pobreza é com demasiada frequência uma sentença de morte, a PEC 171 não pode ser tomada à letra. O Brasil está escolhendo ignorar ativamente as complexas questões sociais afligindo seus jovens desfavorecidos. Ao invés, o país está varrendo estes para debaixo do tapete proverbial, acabrunhando ainda mais um sistema penitenciário já sobrecarregado, e privando infratores adolescentes de qualquer chance de reabilitação. Resta ver ainda se o projeto, de fato, se concretizará, mas para a subclasse marginalizada, e para todos aqueles que acreditam no direito universal à dignidade, as perspectivas parecem sombrias.

Por: Sam Aman, Analista no Conselho de Assuntos Hemisféricos

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Foto destacada: Prisão de Pedrinhas. De: Mario Tama//Getty Images

[1] www.loc.gov/law/help/child-rights/brazil.php#JuvenileJustice

[2] http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/03/entenda-proposta-que-reduz-maioridade-penal-para-16-anos.html

[3] Ibid.

[4] http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/03/entenda-proposta-que-reduz-maioridade-penal-para-16-anos.html

[5] http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/DIREITO-E-JUSTICA/484871-CCJ-APROVA-TRAMITACAO-DE-PEC-DA-MAIORIDADE-PENAL.html

[6] http://www.ebc.com.br/noticias/politica/2015/04/posi%C3%A7%C3%A3o-dos-deputados-comiss%C3%A3o-especial-maioridade%20penal

[7] http://itnet.com.br/pec-da-reducao-da-maioridade-penal-devera-ir-a-votacao-em-junho-na-camara,27178.html

[8] http://riotimesonline.com/brazil-news/rio-politics/brazils-rousseff-opposes-decrease-of-criminal-responsibility-age/#

[9] http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/SEGURANCA/485735-77,8-DOS-DEPUTADOS-DA-COMISSAO-ESPECIAL-DEFENDEM-REDUCAO-DA-MAIORIDADE-PENAL.html

[10] www.cartacapital.com.br/sociedade/reducao-da-maioridade-penal-esta-proxima-de-se-tornar-realidade-9936.html

[11] http://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2015/04/1615892-reprovacao-a-dilma-para-de-subir-mas-maioria-ainda-rejeita-seu-governo.shtml

[12] www.cnn.com/2015/04/12/americas/brazil-protests/

[13] www.nytimes.com/2015/04/27/world/americas/brazils-power-dynamics-shifting-amid-legislative-scandals.html

[14] br.reuters.com/article/topNews/idBRKBN0NS1RF20150507

[15] www.bbc.com/news/world-latin-america-32747175

[16] veja.abril.com.br/noticia/brasil/menor-que-matou-ex-namorada-e-enviou-imagens-para-amigos-sabia-de-punicao-branda/

[17] Ibid.

[18] rachelsheherazade.blogspot.com/2015/03/chega-de-impunidade.html

[19] rachelsheherazade.blogspot.com/2015/04/dez-razoes.html

[20] http://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2015/04/1620652-87-dos-brasileiros-sao-a-favor-da-reducao-da-maioridade-penal.shtml

[21] oglobo.oglobo.com/brasil/unicef-estima-em-1-os-homicidios-cometidos-por-menores-no-brasil-15761228

[22] nacoesunidas.org/em-nota-unicef-se-posiciona-contra-a-reducao-da-maioridade-penal/

[23] https://books.google.com/books?id=htQFPuCV8VwC&pg=PA60&lpg=PA60&dq=marginal+pejorativo+termo&source=bl&ots=beJrP_s6Nc&sig=nRW4AYK446Dtuu7Mmim8o6hNZ64&hl=en&sa=X&ei=rzheVfCFLLWAsQTPp4HABQ&ved=0CEAQ6AEwBQ#v=onepage&q=marginal%20pejorativo%20termo&f=false

[24] www.businessinsider.com/brazils-hellish-penal-system-is-overcrowded-violent-and-brutalising-2014-1

[25] www.state.gov/documents/organization/220636.pdf

[26] www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140313_prisoes_apac_nm_lk

[27] www.fundacaocasa.sp.gov.br/index.php/a-fundacao

[28] Entrevista por telefone com Berenice Giannella. 25 de maio, 2015.

[29] http://brasil.elpais.com/brasil/2014/08/25/opinion/1409001123_689002.html